Domingo, 24 de Novembro de 2024 Adrego & Associados – Consultores de Gestão

Falta de educação trava crescimento do PIB

Todas as semanas os portugueses gastam dinheiro no Euromilhões. São um dos povos da Europa que mais gostam deste jogo que, a troco de ¤2, permite aspirar a ganhar várias dezenas de milhões. Mas este fascínio dos portugueses com o Euromilhões é mais um sintoma das dificuldades dos portugueses com a Matemática.

Afinal, trata-se de uma aposta que, à exceção dos casos em que o jackpot é superior a ¤152,5 milhões – que são raros -, rende menos do que aquilo que custa. Como existem 76,2 milhões de combinações possíveis, o jogador tem uma em 76,2 milhões de hipóteses de acertar na chave vencedora. Se o prémio for de ¤76,2 milhões, o valor esperado (estatístico) da aposta é de exatamente ¤1, ou seja, metade do que custa.

Porque é que os portugueses embarcam nestas apostas? Possivelmente porque sabem pouco de Matemática. Aliás, um artigo publicado pelo Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), de Horácio Faustino, Maria João Kaiseler e Rafael Marques, analisava precisamente os fatores que influenciam a maior ou menor propensão para apostar em lotarias e concluía que a educação era um deles.

Mas o investimento no Euromilhões, tão-pouco rentável à luz de critérios estatísticos, não é o único – nem de longe o maior – efeito nefasto do atraso da educação em Portugal. Quem paga anualmente é o produto interno bruto (PIB), que cresce abaixo do que poderia crescer se o capital humano fosse mais valorizado.

Segundo as últimas estimativas de Robert Barro, da Universidade de Harvard, nos EUA, e Jong-Wha Lee, do Banco Asiático para o Desenvolvimento, um ano a mais de escolaridade média representa um ganho no PIB entre 5% e 12%. Os dois economistas estudam há vários anos a relação entre capital humano e crescimento e atualizaram recentemente as suas séries para 146 países entre 1950 e 2010.

Um travão ao crescimento

ara este ano, as estimativas da série Barro-Lee apontam para que a escolaridade média em Portugal, nas pessoas com mais de 25 anos de idade, seja de 7,73 anos, enquanto na União Europeia ronda os 10,5 anos. Se os portugueses tivessem o mesmo número de anos que os seus parceiros europeus, o PIB nacional poderia ganhar entre 14% e 33%.

“O atraso em termos do stock de capital humano em relação à maioria dos países da OCDE tem tido, e deverá continuar a ter, um efeito prejudicial para o crescimento económico”, avisa António Afonso. O professor do ISEG e economista principal do Banco Central Europeu (BCE) reconhece que tem havido melhorias nas últimas décadas, mas lembra que é preciso mais e que “os efeitos só se sentem após uma ou duas gerações”. Afonso acrescenta que, “em termos de competitividade relativa dos recursos humanos, também nos outros países os progressos continuam, o que torna mais difícil a recuperação de Portugal”.

Para Miguel St. Aubyn, que tem estudado o papel do capital humano na economia portuguesa, “a fraca dotação em capital humano de Portugal é uma das principais, se não a principal, limitação ao crescimento económico”. Isto porque, diz o professor do ISEG, capital humano relaciona-se com a produtividade do trabalho e com a capacidade de inovação. St. Aubyn sublinha, no entanto, que “não basta aumentar o número de anos médio de escolaridade”, já que “os fatores qualitativos são muito importantes e um ano extra de escolaridade pode não significar o mesmo em países diferentes”.

João César das Neves, da Universidade Católica, reconhece a existência de problemas, mas lembra que estas estimativas podem ser demasiado redutoras, já que não é “certamente a mesma coisa subir de cinco para seis anos e subir de 11 para 12 anos”. César das Neves reconhece que o atraso na educação foi decisivo em grande parte do século XX mas é hoje muito menos influente: “Hoje o problema já não é de acesso e quantidade de educação, embora ainda existam problemas a esse nível. A questão decisiva está na qualidade e adequação da formação”.

Nuno Crato, ex-presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática e professor do ISEG, lembra que foram as comparações internacionais que vieram colocar a tónica na qualidade em vez da quantidade: “Enquanto não houve comparações internacionais, como foram o TIMSS e o PISA, os responsáveis da educação negavam a realidade e diziam que tudo estava bem. Enquanto não foram divulgados os resultados das escolas, também se podiam esconder as dificuldades”. (…)

in Exame Expresso

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