Domingo, 24 de Novembro de 2024 Adrego & Associados – Consultores de Gestão

Uma contabilidade sem vícios

A influência em sentido inverso, ou seja, aquela que a fiscalidade tem exercido sobre a contabilidade, foi sempre controversa e discutível, tendo causado, com o passar dos anos, vários diferendos entre as autoridades fiscais e os contribuintes. De facto, as limitações que as regras fiscais têm imposto à contabilidade originam distorções ao nível do relato financeiro, o qual, por esta via, vem privilegiando o propósito do legislador de controle do apuramento do resultado fiscal, em detrimento dos salutares princípios contabilísticos.

As alterações legislativas fiscais introduzidas a propósito da entrada em vigor do Sistema de Normalização Contabilística (SNC), sob o pretexto da necessidade de adaptação das regras fiscais àquele normativo contabilístico, vêm, com efeitos desde 1 de Janeiro de 2010, dar resposta à questão identificada de influência do ordenamento fiscal no relato financeiro, usando a oportunidade criada por este clima de mudança para retirar do normativo fiscal imposições com impacte ao nível da relevância e mensuração de alguns registos contabilísticos.

As referidas alterações tiveram um âmbito alargado, cobrindo áreas como a da aplicação do regime de neutralidade fiscal, em sede do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), às operações de fusão, cisão ou entrada de activos e permuta de activos, a das correcções ao valor de transmissão de direitos reais sobre bens imóveis e a do regime de depreciações e amortizações, sendo que, de uma forma geral, se pretendeu retirar imposições, ao nível do registo contabilístico, por parte da legislação fiscal.

As alterações introduzidas, apesar de tardias, são de louvar por propiciarem a elaboração de um registo contabilístico tendencialmente expurgado de distorções resultantes de imposições directas por parte da legislação fiscal.

Neste novo quadro legal, o controle das realidades tributárias por parte das autoridades fiscais, fito que presidiu à inclusão daquelas – e outras – condicionantes contabilísticas na legislação nacional, passará a ser efectuado através de elementos extracontabilísticos, os quais deverão, na sua generalidade, passar a constar do vulgarmente designado “Dossier Fiscal” e assumirão um papel central na determinação, conciliação e corroboração dos valores considerados para efeitos fiscais.

Não obstante as muitas interrogações que ainda subsistem ao nível dos efeitos práticos que decorrerão da entrada em vigor deste novo paradigma da relação entre fiscalidade e contabilidade, parece ser pacífico afirmar que esta mudança traz maiores exigências ao nível do processo de documentação fiscal, o qual passou a ser dotado de um nível acrescido de complexidade (e de importância) desde 1 de Janeiro de 2010.

in Diário Económico

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