Guia para não se perder na confusão das datas dos novos impostos (act)
Nas últimas semanas, o Governo deixou os contribuintes confusos com tantas voltas que deu às datas do calendário do aumento dos impostos. Depois de assentar a poeira, e de ter visto a proposta de lei que aprovada a semana passada, o Negócios explica-lhe quando é que entram em vigor as diferentes taxas de imposto.
E a partir de quando vai sentir o efeito no seu bolso. Saiba tudo na edição especial de hoje.
IRS – Novas taxas aplicam-se todo o ano, trabalhadores pagam já Taxas sobem para todo o 2010
Nas últimas semanas ouviram-se várias versões sobre a entrada em vigor das novas taxas, agravadas, de IRS, mas é ponto assente que elas se vão aplicar a todo o ano de 2010. Ou seja, a globalidade dos rendimentos do trabalho dependente e independente, rendimentos prediais e de pensões ganhos em 2010 vão ser sujeitos à nova tabela de taxas (ver tabela por baixo da fotografia).
Não importa se foram recebidos em Maio, Abril ou Setembro: os rendimentos são todos somados e sujeitos às mesmas taxas – por isso, não importa quando recebe o subsídio de férias. Então, porque é que o Governo disse que elas só se aplicariam a metade do ano, o que levou a uma “corrida” ao subsídio de férias? Não se sabe, mas admite-se que o Governo estivesse a simplificar a mensagem: ou seja, devia querer sinalizar que o aumento de 1% ou 1,5% das taxas apenas abrangeria os últimos sete meses do ano. Por isso, a tabela de taxas em vez de aumentar entre 1% e 1,5%, como tinha sido inicialmente anunciado pelo Governo, apenas vai subir 0,58% ou 0,88%, o que corresponde a 7/12 da subida inicialmente anunciada. Para 2011, aí sim, prepare-se: os três primeiros escalões sofrem uma subida de 1% e os outros de 1,5%.
É esta proposta que alguns fiscalistas dizem que é inconstitucional, porque a lei, que só será publicada no final de Junho, vai aplicar uma tabela de taxas nova a rendimentos passados. Apesar de polémica, a questão não é consensual. Por isso, para tirar as teimas, é preciso que o Presidente da República ou 20% dos deputados peçam a fiscalização preventiva da proposta de Lei (que deve estar a entrar no Parlamento para ser votada no próximo dia 2). Se não o fizerem, segue para publicação e as dúvidas de constitucionalidade só serão tiradas se algum contribuinte avançar para os tribunais.
Tabelas de retenção sobem já
Além das taxas do IRS, o Governo subiu também as taxas de retenção na fonte que os trabalhadores fazem todos os meses e que antecipam o IRS a pagar no final do ano (é por fazerem estas retenções mensais que a maioria tem, no fim do ano, um reembolso). As novas taxas de retenção também foram publicadas na passada semana e aplicam-se a partir de Junho, apesar de inicialmente o Governo ter dado a entender que poderiam aplicar-se já em Maio. Portanto, o salário que receber no fim de Junho estará mais magro.
Estas tabelas não precisam de ir ao Parlamento, basta que sejam publicadas através de portaria, como o Governo fez. E, apesar de a subida das taxas de retenção resultarem da subida das taxas de IRS, as primeiras podem ser publicadas antes de as segundas estarem em vigor. Embora fosse recomendável esperar, o decreto-lei que regula as retenções na fonte não o proíbe, dizem os fiscalistas ouvidos pelo Negócios.
Recibos verdes retêm mais
Tal como os trabalhadores dependentes, também os independentes têm de ir pagando antecipadamente a subida do IRS. Por isso, passarão a fazer retenções na fonte de 21,5% (em vez dos 20% actuais) e pagamentos por conta de 76,5%. Só que, como estes trabalhadores se regem por um regime diferente, as taxas de retenção só entram em vigor no dia seguinte ao da publicação da proposta de lei, uma data que se desconhece. Os senhorios que tenham como inquilinos empresas com contabilidade organizada, têm de reter 16,5% da renda, em vez de 15%.
Depósitos rendem menos
O IRS que incide sobre os rendimentos de capitais também sobe, de 20% para 21,5%, na generalidade dos casos. Significa isto que os seus depósitos, certificados de aforro e demais poupanças vão render menos. A partir de quando? No dia seguinte ao da publicação
da proposta de Lei.
Mais-valias de todo o ano
Todas as mais-valias mobiliárias realizadas este ano vão pagar IRS. Apesar de ainda não ter sido aprovada no Parlamento, a taxa de 20% aplica-se ao saldo das mais e menos valias deste ano, apuradas a 31 de Dezembro. É também polémica a questão da retroactividade do IRS neste caso. A proposta ainda está a ser discutida no Parlamento e pode levar uma reviravolta.
IRC – Empresas têm que reforçar pagamentos por conta em Julho “Derrama Estadual” aplica-se a todo o ano
As empresas com melhores resultados também vão ser chamadas a pagar mais imposto este ano. Tal como o Negócios já adiantou na passada segunda-feira, trata-se de uma taxa de 2,5% sobre a parte do lucro tributável (antes de considerar os benefícios fiscais e os reportes de prejuízos) que exceda os dois mil milhões de euros.
Esta taxa, que o Governo chama de “derrama estadual”, aplica-se aos lucros apurados em todo o ano de 2010, tal como acontece com o IRS (ver página anterior). Julho não tem qualquer relevância no caso do IRC, e não poderia ter: a matéria colectável é apurada no período anual. Serão chamados a este esforço adicional os sujeitos passivos residentes em território português que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola e os não residentes com estabelecimento estável em território português.
Não se sabe quantas entidades têm lucros tributáveis acima dos dois milhões de euros: as estatísticas da Direcção-Geral dos Impostos não têm este indicador e as Finanças não adiantaram o número. Contudo, sabe-se que o Governo espera encaixar, este ano, cerca de 160 milhões de euros com a medida. Para o ano, espera-se que renda o dobro.
Pagamentos por conta reforçam-se desde já
Tal como acontece no caso do IRS, apesar de o agravamento do IRC só ser apurado no próximo ano, em Maio, quando as empresas entregam a Modelo 22 (a sua declaração contabilística e fiscal), estas têm de ir pagando, desde já, o efeito da subida dos impostos. Como? Através dos pagamentos por conta, que vencem todos os anos em Julho, Setembro e 15 de Dezembro.
As empresas que no ano passado já tenham cumprido o requisito de um lucro tributável superior a dois mil milhões de euros, serão obrigadas a reforçar os pagamentos por conta deste ano com mais 2% sobre o valor que excede o referido patamar de dois mil milhões de euros de lucro tributável. Este valor soma-se ao pagamento por conta que já tem de fazer, com base no volume de negócios do ano anterior. A contabilidade final do imposto a pagar será feita apenas em 2011.
Grupos de sociedades pagam por cada empresa
Outra novidade nesta “derrama estadual” reside no facto de esta incidir sobre as empresas individuais que compõem um grupo de sociedades, e também sobre o lucro tributável da casa- -mãe. Esta regra é contrária à seguida no apuramento do IRC – onde os lucros de cada uma das sociedades são consolidados na sociedade-mãe, só recaindo o imposto sobre esta -, mas segue as determinações das Finanças para o cálculo da derrama municipal. A solução não deverá agradar às empresas e gerar alguma litigância, a julgar pelo que aconteceu com a derrama municipal.
IVA: dos bens essenciais aos de luxo, todos pagam mais Taxa reduzida, intermédia e normal: Nada escapa
Provavelmente vai continuar a não se aperceber, mas, na hora de comprar qualquer bem ou serviço, este vai ter o IVA mais caro. O Governo resolveu subir as taxas do imposto que incidem sobre todos os bens, desde os mais básicos (legumes, leite) que são tributados a 5%, passando pelos intermédios (restauração), até aos bens mais comuns, sujeitos à taxa normal de 20%. Desta vez, nada escapa, e todas estas taxas sobem um ponto percentual.
A mudança dá-se a 1 de Julho e vai penalizar todos os consumidores finais de bens e serviços nas compras que façam a partir dessa data. Fica por saber é quanto, porque há comerciantes que podem optar por não subir os preços, e absorverem eles este custo, em nome dos seus clientes. Isto é possível que aconteça em alguns bens e serviços, mas há aumentos aos quais não se escapa: trata-se dos que têm preços regulados, como a energia, electricidade, serviço telefónico fixo, água, gás natural e transportes, que têm um peso significativo nos orçamentos familiares.
Esta é a terceira vez que o IVA aumenta no espaço de uma década.
Sempre que algum ministro precisa de receita, o IVA tem sido o seu melhor aliado, porque é anestesiante (as pessoas podem sentir que o preço aumenta, mas geralmente não o associam ao imposto e ao Governo) e porque é simples de gerir. Manuela Ferreira Leite lançou mão deste imposto quando, em 2002, precisou de receita; José Sócrates fê-lo em 2005; e, depois de o descer, volta agora a subi-lo.
Mas, desta vez, há uma novidade: é que esta é a primeira vez, nesta década, que se mexe nas taxas reduzidas e na intermédia. Manuela Ferreira Leite subiu a taxa normal de IVA de 17% para 19% e, anos mais tarde, José Sócrates colocou-a nos 21% (para depois a baixar para 20%). Agora, a taxa normal volta aos 21%, mas as restantes também são agravadas em 1%. Esta é a medida mais proveitosa deste acrescento que o Governo resolveu fazer ao plano de austeridade: o Governo espera que ela renda 480 milhões de euros este ano e 1,12 mil milhões de euros em 2011, altura em que terá aplicação plena, a todo o ano. Recorde-se que Portugal é um dos países da zona Euro que mais recorre aos impostos indirectos.
Selo Empréstimos ao consumo com taxas próprias
O imposto de selo que os consumidores pagam quando celebram créditos ao consumo para os mais diversos fins vai quase duplicar. De futuro, quem quiser comprar um electrodoméstico, um automóvel ou um aparelho de electrónica tem de pagar bem mais ao Estado. Tal como o Negócios avançou na edição de segunda-feira passada, as novas taxas variam consoante a duração do contrato: os créditos com duração inferior a um ano passarão a pagar 0,07% de selo por cada mês; os contratos de prazo superior a um ano suportarão uma taxa de 0,9% e os que têm uma duração acima de cinco anos pagam 1% à cabeça para o Estado, por exemplo. Até agora, estas taxas são de 0,04%, 0,5% e 0,6%, respectivamente.
Este agravamento aplica-se a todos os contratos que sejam celebrados após a entrada em vigor da lei. Por enquanto, é impossível saber quando a lei entra em vigor, uma vez que o processo legislativo ainda vai no início.
A proposta foi apresentada na passada quinta-feira em Conselho de Ministros e segue agora para o Parlamento, onde será sujeita a uma votação urgente e única no próximo dia 2 de Junho. Os deputados vão saltar o procedimento habitual de levar as propostas à discussão nas comissões da especialidade (neste caso a de Orçamento e Finanças), e vão dar uma luz verde directa (com votos favoráveis do PS e do PSD) na próxima semana.
Mas depois disso, a proposta segue para Cavaco Silva promulgar. Se este não levantar obstáculos (nomeadamente em relação ao IRS, o caso mais polémico), o diploma vai, enfim, para a Imprensa Nacional Casa da Moeda, para publicação em Diário da República. Estas regras entram em vigor no dia seguinte ao da publicação.