O preço do dinheiro
Numa altura em que é por demais evidente a escassez e carestia do crédito a PME, o Governo multiplica as iniciativas conducentes a aliviar esta importante restrição à actividade económica. Nalguns casos estamos perante medidas corajosas e com alguma eficácia (linhas PME Investe e reforço da Garantia Mútua) e noutras criando incentivos perversos e perturbadores dos interesses da economia e do Estado (abertura de subsídios a empresas com dívidas ao Fisco). Contudo, independentemente das medidas avulsas que vão sendo tomadas, vale a pena perceber que estamos perante um problema estrutural profundo e de carácter durador.
O preço do crédito depende do custo do risco (ou seja da perda esperada que o banco terá na operação), do custo do dinheiro e do custo de todos os outros factores utilizados no serviço prestado aos clientes. O risco acaba por ter dois impactos: um relativo à perda potencial propriamente dita e outro relativo à cobertura da mesma por Fundos Próprios da Banca. Estes, claramente a fonte de fundos mais cara para um banco, são utilizados no financiamento do crédito numa proporção do mesmo que é função do risco tomado.
Infelizmente, conjuga-se à nossa volta um conjunto de factores que irão agravar a maioria dos elementos que determinam o preço e escassez do crédito. Alguns são de natureza doméstica, como seja a indisciplina das finanças públicas portuguesas e sua repercussão no financiamento dos bancos. Outros, principalmente associados à criação de uma nova ordem regulatória financeira, são de natureza global.
A regulação financeira global que começa a desenhar-se pode não ter os detalhes definidos mas tem um contorno bastante claro: os bancos vão ser obrigados a aumentar a cobertura de crédito por Fundos Próprios e a manter rácios de liquidez mais apertados. Ambos os factores vão obrigá-los a utilizar uma maior percentagem de fundos de mais longo prazo, cujo custo excede largamente a Euribor, a taxa de curto-prazo. Ou seja, este maior rigor na gestão de risco vai traduzir-se em aumento do custo do dinheiro utilizado no financiamento do crédito, o qual acabará naturalmente por ser pago pelos devedores.
Vejamos agora os factores de ordem doméstica. A situação da economia portuguesa tem vindo a ditar um aumento do risco das empresas portuguesas. E por essa via, os bancos são obrigados a repercutir esse custo sobre o preço dos créditos e a aumentar a respectiva cobertura com fundos próprios, de que resulta igualmente um acréscimo de custo também repercutir. Os problemas com o rating da República estão a começar a afectar a capacidade de financiamento dos bancos: o mercado de obrigações não se lhes encontra fechado, mas as condições em que são obrigados a emitir têm sido cada vez mais penalizadoras. Ninguém tem dúvidas de que a banca portuguesa tem um nível de risco bastante controlado, em nada comparável com o que assistimos na Grécia ou nos grandes bancos internacionais. Mas é hoje internacionalmente afectada por “um risco país” que resulta da nossa imagem financeira externa, determinada em grande medida pelo comportamento do Estado. E por ser portuguesa, numa altura como a actual, o dinheiro custa-lhe cada vez mais caro. E custa-lhe substancialmente mais do que o dinheiro “comprado” por bancos alemães ou franceses.
Portanto, para as PME e outras empresas, assim como para os particulares, há que ganhar a noção de que a indisciplina financeira do Estado a que temos assistido vai implicar menos crédito, e mais caro. E não vale a pena dizer mal dos bancos: desta vez, eles não passam de mais um portador das más notícias habituais. As medidas do Estado para o facilitar o acesso ao crédito não passam de um pequeno paliativo, aliás pago pelos contribuintes. E como tal, pesam no Orçamento, constituindo mais um contributo para o agravamento do “risco país”. Portanto, para ajudar as PME, nada teria sido melhor do que, na altura certa, ter mantido as contas públicas em ordem.
Paulo Pinho
Professor Universitário