Penso que é um plano respeitável e sério para consolidar as contas públicas portuguesas”
Kevin Dunning avisa para vários riscos no plano de consolidação orçamental português, nomeadamente previsões demasiado optimistas do lado da receita e do crescimento económico, e também o perigo da instabilidade política dificultar a sua implementação.
Ainda assim, o responsável na Economist Intelligence Unit pelo acompanhamento da economia nacional, dá nota positiva ao que já se conhece do plano de consolidação orçamental.
“Penso que é um plano respeitável e sério para consolidar as contas públicas portuguesas”, diz, acrescentando que “se o défice português ficar razoavelmente próximo [mas acima] dos 3% em 2013, isso será, ainda assim, um feito colossal – apesar de conseguido com um custo económico considerável”
O Governo espera uma taxa de crescimento média de cerca de 1,2% entre 2010 e 2013, o que é mais elevado que a média de 2002 e 2008. Parece-lhe razoável?
Parece-me que é uma projecção de crescimento do PIB demasiado optimista, que não leva em linha de conta os efeitos da contenção orçamental nas outras componentes do PIB. Os cortes no sector público irão provavelmente afectar negativamente a confiança dos consumidores e o rendimento disponível, o que significa que o crescimento do consumo privado será fraco. A previsão de crescimento também depende bastante de um crescimento forte das exportações, num momento em que os parceiros comerciais de Portugal terão de lutar muito para criarem uma procura tão elevada, dado que também eles estarão a cortar os seus défices orçamentais ao mesmo tempo.
A consolidação entre 2010 e 2013 (5,5 pontos percentuais, de 8,3% para 2,8%) é conseguida metade (51% ou 2,8 pontos) por um aumento de receitas e metade por um corte de despesa (49% ou 2,7 pontos). É razoável? É suficientemente ambicioso?
O plano para obter metade da consolidação através cortes de despesa e metade por um aumento de receita é certamente razoável, e provavelmente o método politicamente mais aceitável de repartir a dor económica das medidas de austeridade. O calendário do plano é certamente muito ambicioso, o facto de colocar a maior parte do esforço de ajustamento orçamental nos últimos anos é menos bem-vindo.
Em geral, os cortes de despesa tendem a ser uma forma mais eficaz de cortar o défice do que aumentar a receita. No caso português, por exemplo, sabemos que parte do aumento da receita é esperado de medidas extraordinárias como as privatizações e cortes em despesa de capital. A sustentabilidade da consolidação orçamental está mais em risco devido a estas medidas extraordinárias, pois não são de natureza estrutural. Por outro lado, temos de reconhecer as realidades do ambiente político e económico, e perceber que prometer cortes de despesa demasiado fortes é uma opção politicamente insustentável.
Dos 2,8 pontos de PIB aumento de receita, 0,8 pontos vêm de mais impostos (nomeadamente através de cortes nas deduções fiscais na Saúde e na Educação, e de um novo escalão de IRS mais elevado para os rendimentos mais elevados). Os restantes vêm do efeito da retoma económica nas receitas fiscais. Quão arriscada é esta hipótese sobre a melhoria cíclica da economia que explica quase 2/3 da consolidação total?
As expectativas sobre a melhoria cíclica é o elemento mais arriscado das hipóteses do Governo, porque os cortes esperados na despesa deverão contrariar a recuperação cíclica. Isto irá ter um impacto negativo nas receitas fiscais. Os impostos, por oposição, são uma variável mais controlável pelo governo, embora tenha um custo politico.
Qual é a sua avaliação geral do plano apresentado?
Penso que é um plano respeitável e sério para consolidar as contas públicas portuguesas, mas que faz projecções económicas demasiado optimistas (no crescimento do PIB, das exportações, na inflação e no desemprego) numa tentativa de trazer o défice para valores inferiores a 3%.
Também me parece que o calendário, imposto pelas regras da Zona Euro e pela impaciência dos mercados financeiros, é demasiado ambicioso. No entanto, se o défice português ficar razoavelmente próximo dos 3% em 2013, isso será, ainda assim, um feito colossal – apesar de conseguido com um custo económico considerável.
Os principais riscos do plano nascem do perigo dos cortes orçamentais ameaçarem a recuperação; de impulsos deflacionistas resultantes do impacto dos cortes de despesa na procura interna (ameaçando um aumento mais rápido do peso da dívida pública no PIB); das projecções de crescimento da receita com privatizações, que são demasiado optimistas; e, muito importante, do risco político de a implementação do plano ser minada pela oposição política aos cortes de despesa. O governo tem uma tarefa impressionante pela frente, primeiro para vender os cortes orçamentais à população e à Função Pública, e depois para os implementar.