O falhanço de Copenhaga
De boas intenções está o mundo cheio. Um mês depois da conferência do clima em Copenhaga, ficou bem clara a incapacidade do mundo em passar da retórica à acção no que toca ao aquecimento global.
Foi bom de ver, obviamente, como os líderes chegaram a acordo quanto à existência de um risco de devastação em virtude do aumento das temperaturas globais acima dos dois graus. Pelo menos deram ouvidos a algumas das provas científicas crescentes. E alguns dos princípios definidos na Convenção Quadro do Rio em 1992, incluindo “responsabilidades comuns mas diferenciadas e respectivas capacidades” foram também aí afirmadas. O mesmo aconteceu com a aquiescência por parte dos países desenvolvidos no que toca a “disponibilizarem recursos financeiros adequados e recursos financeiros sustentáveis, tecnologia e desenvolvimento de capacidades ….” para os países em desenvolvimento. O falhanço de Copenhaga não se prendeu com a ausência de uma acordo vinculativo. O verdadeiro falhanço prendeu-se com o facto de não ter havido acordo quanto à melhor forma de conseguir esse grande objectivo que é salvar o planeta. Não se chegou a acordo quanto à redução de emissões de carbono, não houve acordo quanto à melhor forma de partilhar esse fardo e não se chegou a acordo quanto às condições de ajuda aos países em desenvolvimento. E até mesmo o compromisso no sentido de disponibilizar montantes na ordem dos 30 mil milhões de dólares entre 2010 e 2012 para adaptação e mitigação parece parco face às centenas de milhões de dólares que foram oferecidos de mão beijada aos bancos nos salvamentos de 2008/2009. Se temos capacidade para salvar os bancos também podemos fazer mais para salvar o planeta. As consequências desse falhanço estão bem patentes: o preço dos direitos de emissões no Esquema de Negociações da União Europeia caiu, o que significa que as firmas terão menos incentivos para investir em inovações com vista a reduzir as emissões no futuro. As firmas que fizeram o que estava certo, gastando dinheiro para reduzir as suas emissões, estão agora preocupadas com o facto de, ao terem agido desse modo, estarem agora em vantagem competitiva face às demais empresas que continuam a emitir incólumes. As firmas europeias vão continuar a estar em desvantagem competitiva face às firmas americanas que continuam a emitir livremente e sem custos alguns.
Subjacentes aos falhanços de Copenhaga estão ainda outros problemas. A abordagem de Quioto afectava direitos de emissões, que são um activo bastante valioso. Se as emissões forem devidamente limitadas, o valor dos direitos de emissões pode ser da ordem dos milhares de biliões por ano – não admira assim que se assista a uma disputa sobre quem deve aceder aos mesmos.
O tempo urge. E enquanto o mundo hesita os gases com efeitos de estufa vão-se acumulando na atmosfera, reduzindo-se assim a possibilidade de o mundo chegar a acordo no sentido de não permitir um aquecimento além dos dois graus. Podemos remeter sempre para os acordos de Quioto, acordos esses que assentavam nos direitos de emissões. Mas, dados os problemas que esses direitos levantam não admira assim que Copenhaga tenha falhado. Está na altura de pensar numa alternativa.
Tradução de Carlos Tomé Sousa
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Joseph Stiglitz, Prémio Nobel da Economia em 2001